‘O suicídio é um gesto nobre (…) Ele é mesmo uma voz da Natureza para o animal que tem bons ouvidos. O lacrau. A baleia. Muito pássaro engaiolado. Quando nasceste a Natureza disse-te toma lá a vida e sê contente com ela. Não te disse toma lá a vida e espera aí um pouco que eu já te codilho. E que fazer se ela é um estupor? se ela ta dá e depois te cai em cima com um cancro invalidez fome cegueira paralisia reumatismo hidrocelos hepatites zumbideiras nos ouvidos trombose afasias pancada na mioleira e traições humilhações públicas e privadas depressões angústias metafísicas desastres políticos desastres amorosos burlas ambições amochadas derrotas no futebol na lotaria nas artes e letras e mais e mais e mais? O suicídio é o único acto nobre com que se pode enfrentar a traição da Natureza. Porque ela espera de nós o quê? Ela espera de nós a cobardia, a submissão abjecta, o comer e calar. Não vos caleis. Falai a única linguagem que ela e os deuses entendem. O suicídio é um acto nobre e corajoso e os que se suicidaram ficaram na História com o seu exemplo sublime. Catão, Lucrécio, Séneca, Luciano, Petrónio, quantos mais. Não se conta de ninguém que morreu de caganeira. Não se conta de suicídio senão dos romanos mas não dos gregos que eram uns merdas. Mas sempre o suicídio se assinalou como a razão da morte de quem teve razão na vida. Ele é mesmo o acto sacramental glorioso como abrir as tripas num país que conheceis. E é poruqe a Natureza conta com a vossa abjecção que há gente excedentária no planeta. Vede os pretos e amarelos que se multiplicam como as moscas. Assim o suicídio é uma acção benemérita em favor dos povos enquanto não for uma acção obrigatória como pagar uma multa por um carro mal estacionado. Glória aos precursores voluntários desta medida higiénica e demográfica, antes de ela vir a ser uma obrigação constitucional.
(…) Passava à questão prática da escolha do modo suicidário. Porque isto é naturalmente importante.(…) Isto tem uma graduação cultural de dignidade, sexo e até de classe. Já imaginaram um militar ou um arcebispo suicidarem-se com pesticidas? Ou um campónio com barbitúricos? Ou uma mulher com uma espingarda caçadeira que lhe deixasse a cara em fascículos? Não sou tão exigente ou rigoroso que vos aconselhe um método de execução. Eles são mesmo inúmeros porque a necessidade humana é imensa. Mas dou-vos alguns para uma ementa mais variada. Eles são, aliás, os mais correntes, ou seja os mais batidos na experiência. Escolhei. Mas sede prudentes e escolhei com ponderação. Os métodos que vos sugiro são: 1 – o tiro. É rápido e funcional. E tem a vantagem de não precisar de preparativos. 2 – por enforcamento. Também é rápido mas tem o inconveniente de se ter de montar a corda, armar o laço, subir para um banco, empurrá-lo e ficar com a língua de fora. 3 – afogamento. Incómodo. Mais lento e com o incómodo da água. 4 – o punhal. Só praticável para homens históricos e já um pouco fora de uso. E há a sangueira. 5 – o veneno. É conforme. Os pesticidas proletários dão dores que se fartam. Os barbitúricos são mais suaves. Adormece-se e não vale a pena chamarem porque já se não acorda. Mais próprios para mulheres que têm sempre a esperança de que de todo o modo as acordem. 6 – debaixo do comboio ou do metro. Método também popular. Pouco cordial para quem tem de apanhar os destroços. Mas de decisão rápida. Está-se ao pé da linha e a decisão vem ou não vem. Se vem, é logo. 7 – cortar as veias. É um método clássico e histórico para quando não havia o tiro nem o comboio. Muito digno. Mas muito sujo. O exemplo mais célebre é o de Petrónio que tapava e destapava a veia para ir entretendo o paleio com os amigos e ir morrendo por etapas. Pouco recomendável para os tempos modernos pela demora e falta de limpeza. São estes sete processos que vos proponho porque o 7 é um número esotérico e contém portanto uma verdade profunda. '
(…) Passava à questão prática da escolha do modo suicidário. Porque isto é naturalmente importante.(…) Isto tem uma graduação cultural de dignidade, sexo e até de classe. Já imaginaram um militar ou um arcebispo suicidarem-se com pesticidas? Ou um campónio com barbitúricos? Ou uma mulher com uma espingarda caçadeira que lhe deixasse a cara em fascículos? Não sou tão exigente ou rigoroso que vos aconselhe um método de execução. Eles são mesmo inúmeros porque a necessidade humana é imensa. Mas dou-vos alguns para uma ementa mais variada. Eles são, aliás, os mais correntes, ou seja os mais batidos na experiência. Escolhei. Mas sede prudentes e escolhei com ponderação. Os métodos que vos sugiro são: 1 – o tiro. É rápido e funcional. E tem a vantagem de não precisar de preparativos. 2 – por enforcamento. Também é rápido mas tem o inconveniente de se ter de montar a corda, armar o laço, subir para um banco, empurrá-lo e ficar com a língua de fora. 3 – afogamento. Incómodo. Mais lento e com o incómodo da água. 4 – o punhal. Só praticável para homens históricos e já um pouco fora de uso. E há a sangueira. 5 – o veneno. É conforme. Os pesticidas proletários dão dores que se fartam. Os barbitúricos são mais suaves. Adormece-se e não vale a pena chamarem porque já se não acorda. Mais próprios para mulheres que têm sempre a esperança de que de todo o modo as acordem. 6 – debaixo do comboio ou do metro. Método também popular. Pouco cordial para quem tem de apanhar os destroços. Mas de decisão rápida. Está-se ao pé da linha e a decisão vem ou não vem. Se vem, é logo. 7 – cortar as veias. É um método clássico e histórico para quando não havia o tiro nem o comboio. Muito digno. Mas muito sujo. O exemplo mais célebre é o de Petrónio que tapava e destapava a veia para ir entretendo o paleio com os amigos e ir morrendo por etapas. Pouco recomendável para os tempos modernos pela demora e falta de limpeza. São estes sete processos que vos proponho porque o 7 é um número esotérico e contém portanto uma verdade profunda. '
Na tua Face, Vergílio Ferreira
2 comentários:
onde é que eu já li isto?
ah! já me lembro! foi na folha que estava dentro do livro que me emprestaste sobre o suicidio!
a loucura total!
Escrevi no google "cortar as veias" e voilá, vim parar aqui,lol...
Tenho veneno dos ratos aqui ao pé de mim desde Agosto do ano passado, mas acho que dá dor de barriga, tenho pensado nessa cena de cortar a veia só que fico do lado de fora da banheira com o braço do lado de dentro...
entretanto espero um milagre da mãe natureza que saiu para ir comprar tabaco e nunca mais voltou...
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