Não há coisa que eu mais odeie que aquelas obras de arte que têm títulos como “Proposição 1”, ou, pior, “Sem Título 134”. Irrita-me. Para mim o título de uma obra pode ser arte, só por si. Apercebi-me disto quando vi um quadro, há alguns anos, no Museu Machado de Castro em Coimbra. Com cores vivas, tipo cartoon, estava um monte de lixo em primeiro plano – meias sujas, garrafas, papel – e no canto uma rosa. Mas a sombra daquele monte de lixo, que se projectava atrás, era o perfil da cidade de Coimbra – não sei se estão a ver, a Cabra e a Universidade lá em cima, aquelas casecas por aí abaixo. Título da obra: “São Rosas, Senhor”. Fantástico. Se tivesse dinheiro e fosse maior de idade tinha comprado aquele quadro logo ali. Se tivesse o mínimo de sentido de futuro tinha apontado a porcaria do nome do autor.
E não poderemos esquecer o “Ceci n’est pas un pipe”, de Magritte, orgulhoso logotipo da PenetrArte, ou mesmo ‘La Fontaine’ de Duchamp.
Resolvi então dar aqui alguns títulos de obras que me despertam o sentido estético da leitura:
De Dalí, esse prolífero inventor de títulos estranhos:
- Todas as Formas Derivam do Quadrado (composição cubista)
- O Mel é mais Doce que o Sangue
- A Vaca Espectral
- A Amálgama – por Vezes Cuspo com Prazer no Retrato de Minha Mãe
- A Nostalgia do Canibal
- Pão Francês Médio com Dois Ovos Estrelados a Cavalo, sem o Prato, Tentando Sodomizar um Bocado de Pão Português
- Devaneio – Recomendação: Estragar Completamente a Ardósia
- Fonte Necrofílica Correndo de Um Piano de Cauda
- Burocrata Médio Atmosferocéfalo a ordenhar uma Harpa Craniana
- O Espectro de Vermeer de Delft Podendo Ser Utilizado como Mesa
- Omeleta Caminhando Irresistivelmente para o Esmagamento pelas Mãos
- O Sonho Coloca a Mão no Ombro de um Homem
- O Farmacêutico de Ampurdán à Procura de Absolutamente Nada
- Destroços de Um Automóvel Dando à Luz um Cavalo Cego que Morde um Telefone
- Telefone Num Prato com Três Sardinhas no Fim de Setembro
- O Perverso Polimorfo de Freud, também conhecido como Criança Búlgara a Comer um Rato
- Dois Bocados de Pão Exprimindo o Sentimento do Amor
- Adereço de Nú com Cauda de Bacalhau
- As Chamas, Chamam
- Sonho Causado pelo Voo de Uma Abelha à Volta de uma Romã, Um Segundo antes do Despertar
- Fonte de Leite a Correr em Vão sobre Três Sapatos
- Nariz de Napoleão Transformado em Mulher Grávida Passeando a Sua Sombra com Melancolia entre Ruínas Originais
- Relógio Mole Explodindo em 888 Pedaços após Vinte Anos de Completa Imobilidade
- Jovem Virgem Auto-Sodomizada pelos Cornos da Sua Própria Castidade
- Dioniso Cuspindo a Imagem Completa de Cadaqués na Ponta da Língua de Uma Mulher com Três Gavetas
- Árabes Ácidodesoxirribonucleicos
- Um Relógio Mole Colocado no Local Adequado que Faz Morrer e Ressuscitar um Jovem Efebo por Excesso de Satisfação
- Cama e Duas Mesas-de-Cabeceira Atacando Ferozmente um Violoncelo
Outros artistas:
- Cruzeiro Seixas, O Quotidiano (uma chávena de chá com florinhas e a asa no interior da chávena)
- Merlin Carpenter, Quando Não está Nada dentro de Ti além de Ti
- Maurizio Cattelan, Ele (fotomontagem de Hitler ajoelhado)
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